quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Inspiração de Flaubert

E. B. levantou da cama suada e exasperada. Não conseguiu dormir nem três horas e o barulho que os gatos faziam a incomodava demasiadamente. Pela janela via os animais irrequietos, atordoadamente atraídos pelo cheiro que uma gata no cio exalava.

 

A gata no cio se contorcia de vontades e seus gestos demonstravam claramente para E. B., que sua agonia residia na certeza de que os 14 gatos ao seu redor não conseguiriam aplacar sua volúpia. E. B. se excitava com aquela visão e, impacientemente, entendia o desespero da gata no cio e sabia mesmo que os gatos não seriam suficientes. Também já havia sentido essa urgência. Aliás, sentia-a agora. Foi o que a acordou: outro sonho de entrega total em que, paradoxalmente, controlava todas as suas preferências.

 

Era mais um sonho, como tantos outros, que a acordara, mas agora a visão da gata no cio havia reforçado sobremaneira as imagens do subconsciente. Sua vontade era a mesma da gata. O desespero daquele animal correspondia ao mesmo sentimento que ela sentia. Contudo, E.B. invejava a gata no cio por ela possuir agora, ainda que insuficiente, 14 gatos ao seu dispor. Nesta noite, E.B. tinha apenas ela mesma.

2 comentários:

Rejane Valério disse...

Que ótimo esse, infelizmente ainda não li Flaubert assim não fiz a inferência.

Anônimo disse...

Terminei Madame Bovary agora (irei postar algo ainda hoje), muito bom Flaubert tem um texto interessantísimo, claro e profundo, contruído com bastante afinco, dá pra sentir!. Leia

Rui